sábado, 4 de maio de 2013

Modernismo

"O Modernismo não foi apenas um movimento literário, mas, como tinha sido o Romantismo, um movimento cultural e social de âmbito bastante largo, que promoveu a reavaliação da cultura brasileira, inclusive porque coincidiu com outros fatos bastante importantes no terreno político e artístico, dando a impressão de que na altura do Centenário da Independência (1922) o Brasil efetuava uma revisão de si mesmo e abria novas perspectivas, depois das transformações mundiais da guerra de 1914 - 1918 [Primeira Guerra Mundial], que aceleraram o processo de industrialização e abriram um breve período de prosperidade para o nosso principal produto de exportação, o café"

É assim que Antonio Candido inicia sua análise do período modernista em Iniciação à literatura brasileira. Um movimento literário que se destaca pelo desejo de quebrar a anestesia dos sentidos, tão estudada pelos parnasianos e simbolistas, e colocar a arte/o mundo em um lugar de descoberta

 - Como transformar a forma e o conteúdo da literatura da época, tão gasta e ausente de novidade?

O fundamento do modernismo, portanto, era provocar um olhar de estranhamento no público, com a intenção de colocar o mundo - e todas as suas contradições - sob um novo prisma.
A arte moderna rompeu com a vontade de comover o público. Acreditava que essa forma de fazer arte era desumanizada e manipuladora de emoções. Sendo assim, seu desejo principal é provocar o público/leitor!

"O livro inicial do movimento foi Pauliceia Desvairada (1922), de Mário de Andrade, cujo principal personagem é a cidade de São Paulo, em processo de desenvolvimento vertiginoso e em vias de transformar-se na mais importante do país pela população e potência econômica" - Candido.

O desejo de retomar o primitivismo, encontrar as raízes que nos formam enquanto nação também foi um fator de motivação para a criação artística. Macunaíma, por exemplo, foi o resultado de uma pesquisa intensa de Mário de Andrade, que desejava encontrar uma linguagem fiel a esse "desvairismo brasileiro". Não pretendia reproduzir a imagem romântica do índio de José de Alencar, e nem reproduzir o português vernáculo imposto por Portugal, mas encontrar uma identidade própria, ainda desconhecida, mesmo 100 anos após a nossa independência. Defende que a literatura brasileira deve ter um papel de RESISTÊNCIA, e propõe uma mudança de percepção para que se possa enxergar para além do que é dito.

Uma busca pela identidade do ser brasileiro - "um herói sem nenhum caráter".

"O Brasil não tem brasileiros"

"Indo às consequências finais da posição de José de Alencar no Romantismo, Mário de Andrade adotou como base da sua obra o esforço de escrever numa língua inspirada pela fala corrente e os modismos populares, não hesitando em usar formas consideradas incorretas, desde que legitimadas pelo uso brasileiro. Com isso, foi o maior demolidor da 'pureza vernácula' e do 'culto da forma'." - Candido.

Esse mesmo primitivismo também levou Oswald de Andrade "a uma interpretação fecunda da cultura brasileira como assimilação destruidora e recriadora da cultura europeia, com vistas a uma civilização desrecalcada e antiautoritária, cujo marco se encontra no importante MANIFESTO ANTROPOFÁGICO (1928).

Uma obra de Mário de Andrade que simboliza diretamente o rompimento que desejava estabelecer com os movimentos anteriores, é A escrava que não é Isaura, que dedica a seu amigo "Osvaldo de Andrade". Nela, há uma referência direta a este rompimento logo no título: em 1875, Bernardo Guimarães havia publicado A escrava Isaura, obra pertencente ao romantismo e que foi reconhecida até pelo imperador Dom Pedro II.
Era necessário uma escrava do Ararat: "a escrava do Ararat chamava-se Poesia".
"Essa mulher escandalosamente nua é que os poetas modernistas se puseram a adorar... Pois não há de causar estranheza tanta pele exposta ao vento à sociedade educadíssima, vestida e policiada da época atual?"

A Semana de Arte Moderna e todo o movimento que foi se construindo nesse período tomou proporções gigantescas historicamente. Mas logo no prefácio dessa mesma obra, Mário de Andrade conta:

"É mentira dizer-se que existe em S. Paulo um igrejó literário em que pontifico. O que existe é um grupo de amigos, independentes, cada qual com suas ideias próprias e ciosos de suas tendências naturais. Livre a cada um de seguir a estrada que escolher. Muitas vezes os caminhos coincidem... Isso não quer dizer que haja discípulos pois cada um de nós é o deus da sua própria religião. Vamos à história!"

Nesse sentido, é preciso considerar que:
- não houve preparo por parte dos membros do período modernista, tudo foi surgindo dessa necessidade de criar um novo país;
- faltaram recursos para fazer uma intervenção de movimento mais forte e que atingisse todo o país;
- foi limitada; as coisas que ocorreram em São Paulo não chegaram em todos os estados do país.

Um país que ainda tinha escravidão, que poderosos desejavam realizar o branqueamento social nessa terra, que prendia e matava negros, que não permitia que mulheres andassem sozinhas nas ruas, que não dava condições plenas de vida aos seus cidadãos, PRECISAVA ser remexido, deslocado, transformado.

Em Vanguardas latino-americanas há um belíssimo trecho também de Mário de Andrade que explica de forma metafórica as intenções desse movimento:

“Estamos realizando o mistério alimentar do aipim. Arranca-se a planta bonita que enverdece a terra. Mas, porém, surge agarrada no caule, a raiz que mata a fome. Essa fome de pátria, porca parida que devora os próprios filhos”.

Isto é, o que se produzia artisticamente antes não "matava a fome" do povo miserável que habitava essas terras. Apenas enfeitava, mostrava para quem olhasse de longe o quanto era belo esse lugar. Mas quem se aproximava percebia a nossa miséria. E o que os modernistas queriam era matar a fome de pátria desse povo: criando um Brasil que fosse dos brasileiros!




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